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Em meados de setembro de 2023 vieram à tona, em veículos midiáticos e redes sociais, imagens e vídeos de alunos de uma faculdade de medicina, supostamente se masturbando nas arquibancadas de um ginásio, enquanto acompanhavam um jogo de vôlei feminino, de uma competição que reunia universidades.
Como a notícia chegou ao conhecimento do Delegado de Polícia Civil responsável pela circunscrição em que se deu o evento “supra”, a partir da “notitia criminis” de cognição direta (quando a Autoridade Policial toma conhecimento da prática de uma infração penal por meio de suas atividades rotineiras) houve a instauração do caderno investigatório pertinente.
A Polícia Federal tem atribuição de investigação em crimes de misoginia praticados contra mulheres, quando praticados por meio da rede mundial de computadores:
Art. 1o Na forma do inciso I do § 1o do art. 144 da Constituição, quando houver repercussão interestadual ou internacional que exija repressão uniforme, poderá o Departamento de Polícia Federal do Ministério da Justiça, sem prejuízo da responsabilidade dos órgãos de segurança pública arrolados no art. 144 da Constituição Federal, em especial das Polícias Militares e Civis dos Estados, proceder à investigação, dentre outras, das seguintes infrações penais:
(…)
VII – quaisquer crimes praticados por meio da rede mundial de computadores que difundam conteúdo misógino, definidos como aqueles que propagam o ódio ou a aversão às mulheres. (Grifei)
A misoginia pode se manifestar de várias maneiras, incluindo a exclusão social, a discriminação sexual, a repulsa, o desprezo e etc.
Não haveria empecilho jurídico em uma atuação conjunta entre a Polícias Federal e Civil na investigação do caso em comento.
Preliminarmente, como não há notícia de que os alunos chegaram a tocar as atletas durante a partida ou no intervalo, e ao final do jogo, numa análise fria estaria configurado o crime previsto no art. 233 do Código Penal:
“Praticar ato obsceno em lugar público, ou aberto ou exposto ao público: Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa”.
Apesar de ser uma infração de menor potencial ofensivo, delito apurado por meio de termo circunstanciado de ocorrência, previsto no p. único do art. 69 da Lei 9099/95, como o fato em testilha é complexo, pois envolve uma pluralidade de autores, a própria Lei dos Juizados Especiais Criminais recomenda a instauração de inquérito policial.
Inclusive a necessidade de se perquirir a idade dos que praticaram a lamentável conduta nas arquibancadas, pois além do ato infracional praticado por algum adolescente (hoje, o jovem consegue a aprovação em cursos de graduação antes dos 18 anos), haveria o crime de corrupção moral do menor, delito previsto no art. 244-B do ECA.
Há controvérsia sobre se o ato de urinar em local aberto ao público, com o genital exposto a todos, configuraria o crime de ato obsceno, pois faltaria o cunho sexual. Antes da edição da Lei 13.718/18, vozes chegaram a sustentar que configuraria a contravenção prevista do art. 61 da LPC (hoje revogada).
A famigerada “chispada”, que ocorre quando a pessoa corre em disparada, sem qualquer roupa no corpo, nu, em via pública, configura ato obsceno.
Já decidiu o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios sobre o crime do art. 233 do Código Penal:
Manifestação de cunho sexual praticada em local público ou aberto ao público, capaz de ofender o pudor médio da sociedade, configura o crime de ato obsceno. A defesa interpôs recurso contra a decisão que condenou o acusado pela prática do delito de ato obsceno (art. 233 do CP). Para os Desembargadores, a conduta do réu enquadra-se devidamente na tipificação penal, na medida em que ele, com nítida conotação sexual, colocou os seus seios à mostra em estação rodoviária na qual transitava um grande número de pessoas, provocando vergonha nos transeuntes e ferindo o pudor público. Os Julgadores ressaltaram que, apesar de a defesa sustentar que o acusado não se recordava dos fatos por ser dependente químico, a embriaguez voluntária pelo álcool ou por substâncias de efeitos análogos não exclui a imputabilidade penal, conforme prevê o art. 28, II, do CP. Também afastaram a alegação defensiva de liberdade de expressão, uma vez que o réu agiu com acinte, jogando lixo pelo chão e ofendendo as pessoas, sem qualquer alusão a um trabalho artístico. Dessa maneira, a Turma negou provimento ao recurso.
Acórdão n. 986424, 20150111116715APJ, Relator Juiz ARNALDO CORRÊA SILVA, 2ª Turma Recursal, Data de Julgamento: 7/12/2016, Publicado no DJe: 19/12/2016.
Como a masturbação coletiva, que ocorreu em local público, tem cunho sexual é indiscutível que os alunos praticaram o crime de ato obsceno.
O que resta de dúvida é a questão de ter ocorrido possíveis crimes de importunação sexual, crime previsto no art. 215-A do Código Penal:
“Importunação sexual (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)
Art. 215-A. Praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro: (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)
Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o ato não constitui crime mais grave. (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)”.
Apesar de ser um crime subsidiário, que é aquela infração que somente se configura caso a conduta do agressor não constitua crime mais grave, como por exemplo um estupro ou estupro de vulnerável.
Tal delito é comumente praticado em veículos de transporte coletivo, tais como ônibus, trens e até em aviões, como recentemente noticiado numa revista eletrônica semanal. O homem, no interior dos locais mencionados, acaba por tocar a mulher em suas partes íntimas sem consentimento algum, de maneira sub-reptícia ou não, inclusive alguns chegam a se masturbar e ejacular nas vítimas.
Se durante as investigações, restar apurado que os autores além da masturbação em público, tocaram em suas partes íntimas ou ejacularam nas atletas, teremos também a importunação sexual.
Até onde foi divulgado, os alunos já foram punidos pela instituição que pertenciam. Apesar de o crime de ato obsceno ser passível dos benefícios previstos na Lei dos Juizados Especiais Criminais, a imposição de condições para aplicação das medidas alternativas devem ser exemplares aos alunos que praticaram a masturbação coletiva ofendendo às atletas em quadra e as próprias colegas de torcida.
Fonte: CJ Estratégia